Origens


por Luiz Henrique Matos

Se você vive numa cidade como São Paulo, é capaz de morar a 30 minutos de um lugar sem jamais ir até lá. Se esse local – um bairro – foi onde você nasceu, pode soar como anos e anos sem voltar à sua terra natal.

Na última segunda-feira, fui logo cedo levar um casal de primos à rodoviária e aproveitei que tinha algum tempo livre (estou de férias) para esticar o caminho de volta por mais quatro quadras até a rua onde nasci e morei até os nove anos. Cheguei a voltar lá outras vezes depois que nos mudamos, mas já fazia 15 anos que não pisava naquela rua – uma vila – espremida num bairro velho da cidade.

Achei que o lugar não existiria mais – só tem uma coisa que você vê mais do que padarias e pombinhas em São Paulo: obras – mas me enganei. Está tudo lá, exatamente do jeito que era na década de 80. O bairro todo, as casas, as fábricas, o barzinho, a farmácia, o posto de combustível… o tempo foi passando e aquela paisagem industrial só ganhou uma coisa: poeira. O lugar está sujo, cinzento. Pensando bem, talvez sempre tenha sido, mas crianças não notam esse tipo coisa.

Eu vi a casa onde cresci. Sempre pintávamos de bege, mas agora está azul. Eu passei de carro pela rua, a Nina dormindo atrás, nem desci.

Lembrei do tempo bom da infância ali, da vizinhança e das manhãs, mas não tive nenhum flashback ou aqueles sentimentos revividos, nada. Vi o que vi, tirei umas fotos com o celular e fui embora.

Só lembrei mesmo de um evento engraçado. Nas vésperas da mudança, combinei com o Cuca, meu melhor amigo, que um dia voltaríamos ali. Calculamos um tempo, quando já estaríamos bem mais velhos e teríamos rodado todo o mundo, aos 20 anos, e nos reencontraríamos na vilinha (é como chamávamos a rua) para fazer sei lá o quê.

Atrasei 10 anos no acordo selado em 1989. Encontrei o Cuca, casado e de barba, pela internet há alguns anos e as coisas vão como vão. E, sim, ele ainda atende por Cuca.

A Nina nem acordou. Eu até queria que ela conhecesse a casa, a vila, o clima do lugar. Ela vive me pedindo pra contar histórias sobre a minha infância. De repente, notei que na idade dela, eu morava ali, brincava naquele asfalto e dava meus primeiros passos. A história toda que eu conto se passou naquele cenário.

O passado é uma coisa curiosa. Não que eu ache bacana esse saudosismo, nem acho, mas às vezes é bom a gente olhar para trás para entender, nas marcas, caminhos e histórias, a construção do que somos hoje.

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