Eu dou esmolas


por Luiz Henrique Matos

Eu costumo dar esmolas. Sei que os especialistas não recomendam, falam que a maior parte dessas crianças que fazem malabarismos e dos velhinhos com suas caixas de balas jujuba nos semáforos são, na verdade, explorados por algum tipo de organização criminosa. Falam também que isso não contribui para o desenvolvimento social sustentável. Eu sei. Mas eu dou mesmo assim. Não consigo ignorar aqueles dedos batendo no vidro como se não fosse uma necessidade urgente.

Geralmente estou no carro e não resisto. Vejo aqueles olhos cansados, aquela pele castigada, as roupas sujas, os pés descalços… e então limpo meu porta-níqueis e dou as moedas que tenho comigo. Eu sou das pessoas que aceita todos os panfletos de propaganda imobiliária que distribuem nos cruzamentos.

Não, eu não sou um cara bonzinho. Dou por obediência àquilo em que creio, a Bíblia diz que devemos dar esmolas – não parei para avaliar o contexto, estou tentando obedecer somente. Mas depois eu fico pensando e acho que dou mesmo é para limpar minha consciência. Abro mão de alguns centavos em moedas para não me sentir culpado ao gastar mais do que acho justo numa calça nova. Dou o suficiente para que aquela criança compre um pão com manteiga no bar da esquina, para não dever nada a mim mesmo quando quiser torrar trinta vezes aquele valor num sanduíche na lanchonete bacana do shopping.

Eu poderia fazer muito mais. Vejo todas as mazelas da cidade grande passando pelo vidro do carro enquanto dirijo e só deixo que meu coração se compadeça por alguns minutos. Aí mudo a estação no rádio e me preocupo mesmo, afinal, se meu time está em quinto ou sexto lugar na tabela de classificação do campeonato e se vou conseguir cumprir o prazo de um relatório que pediram lá no escritório. E isso me ocupa o dia todo.

Eu sei, tem alguma coisa errada na ordem das coisas. Reclamo todo dia dos tantos males que afetam o planeta, da corrupção, das doenças, da injustiça, da fome. Alguma coisa precisa mudar. Alguma coisa precisa mudar em mim.

Alguma coisa eu preciso mudar.

“Os pobres são evitados até por seus vizinhos, mas os amigos dos ricos são muitos. Quem despreza o próximo comete pecado, mas como é feliz quem trata com bondade os necessitados! Oprimir o pobre é ultrajar o seu Criador, mas tratar com bondade o necessitado é honrar a Deus.” (Provérbios 14:20, 21 e 31).

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