Ato patriótico


Aprendi a dobrar a bandeira Nacional quando era escriturário em um banco.

Uma das minhas tarefas de rotina era recolher a bandeira do mastro no final do dia. Para tanto, havia um protocolo a ser seguido. Pelo menos foi o que Leonildo, meu chefe na época, me disse solene da primeira vez.

Na forma de retirar o mastro, de recolher a bandeira, chamar alguém para ajudar a segurar as pontas, jamais deixar cair ou raspar no chão (eu achava que um raio cairia do céu na minha cabeça ou um esquadrão da Rota apareceria atrás de mim se eu derrubasse aquilo) e dobrar, que era um ritual à parte. Primeiro, uma dobra longitudinal em toda a bandeira e depois, formar um triângulo com uma das pontas e ir juntando até ela ficar num formato triangular compacto. Sem sobras, rebarbas, sem amarrotar. Ao final, levar a bandeira repousando sobre as duas mãos, como se fosse uma bandeja – nunca embaixo da axila ou com uma mão só – e guardar no lugar apropriado.

Até hoje, não sei dizer se existe mesmo um jeito oficial de dobrar a bandeira e se é assim mesmo que se faz. Nunca busquei isso no Google para conferir se aprendi, de fato, algum gesto cívico ou fui vítima de trote. Tenho medo da resposta em qualquer dos casos – ainda que ache bonita nossa bandeira e tenha uma guardada em casa e devidamente dobrada, tal qual o protocolo, para ocasiões de Copa do Mundo. Mas sei que foi assim que o Leonildo me ensinou e assim me supervisionava diariamente.

Era preciso um certo espírito de reverência para recolher aquele pedaço de pano que ficava o dia todo pendurado ao relento em uma avenida comercial na periferia da cidade, sujeito à fumaça dos veículos, chuva e vandalismos e depois dormia em berço esplêndido no armário da nossa repartição.

– É patriotismo, menino. Tem uma lei, um protocolo para seguir.

Ele adorava a palavra protocolo.

(…minha crônica dessa semana para o Estadão. Continua lá no site)

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